quarta-feira, 21 de outubro de 2020

EMPODERAMENTO - OUTUBRO ROSA

Empoderamento é ter vontade de desistir, mas não desistir

É lutar, com vontade de cair

É ter medo, mas não se abalar

É ver o último fio cair, mas sorrir

É se sentir quebrada, mas se manter de pé

É chorar, na frente de um filho

É abraça-lo e se sentir segura

É combater um mal com outro mal

Mas continuar

Persistir

É querer viver

Você se acha empoderada?

O empoderamento tem nome

Se chama Maria

Sofreu sozinha

Sofreu com os filhos

Mas lutou

E para lutar, sofreu

Todos os dias

E não parou

Pois queria viver

E sem saber

Ela se tornou a senhora do seu destino

A dona da sua vida



sexta-feira, 25 de setembro de 2020

AUDIÊNCIA OBRIGATÓRIA – UMA REVOGAÇÃO NECESSÁRIA?

 



Marcio Henrique Ribeiro

25 de setembro de 2020.

 

O artigo 16 da Lei nº. 9.099/95 prevê que: “Registrado o pedido, independentemente de distribuição e autuação, a Secretaria do Juizado designará a sessão de conciliação, a realizar-se no prazo de quinze dias”.

Logo, o legislador previa que antes mesmo da distribuição do processo, a secretaria do juizado designaria uma audiência de conciliação para 15 dias.

Tal previsão seguia os princípios instituídos no artigo 2º da Lei dos Juizados: “O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação”.

Nota-se que o mesmo artigo já previa que o Juizado Especial Cível deveria priorizar pela conciliação ou a transação, novamente no intuito de trazer um procedimento mais célere, informal e econômico.

Contudo, a prática nos ensina que o ideal do legislador dificilmente é alcançada, começando com a designação da audiência antes da distribuição da demanda, sendo realizada 15 (quinze) dias após a reclamação do autor.

Na verdade, o procedimento dos Juizados segue um ritmo diferente da legislação, variando, também, de estado para estado.

Tomando por base do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, os processos são distribuídos e autuados automaticamente, com, inclusive, a designação de uma audiência de conciliação.

No entanto, diferente do previsto na Lei nº. 9.099/95, a audiência não é designada para daqui a 15 dias, fato impossível para o número de distribuições diárias de novos processos.

Além disso, sendo marcada uma audiência tão próxima, a citação poderia ocorrer também muito próxima, contrariando os ditames da lei processual, isso porque, o Código de Processo Civil/1973 (em vigor na época da criação da Lei nº. 9.099/95) instituía que o prazo mínimo que deveria entremear a citação e a audiência era de 10 (dez) dias, conforme artigo 277, vejamos:

 

Art. 277. O juiz designará a audiência de conciliação a ser realizada no prazo de trinta dias, citando-se o réu com a antecedência mínima de dez dias e sob advertência prevista no § 2º deste artigo, determinando o comparecimento das partes. Sendo ré a Fazenda Pública, os prazos contar-se-ão em dobro. (Redação dada pela Lei nº 9.245, de 26.12.1995)

 

Lembrando que o Código de Processo Civil é aplicado subsidiariamente, conforme artigo 92 da Lei nº. 9.099/95.

Assim, as secretarias dos Juizados passaram a designar as audiências de conciliação de acordo com a agenda interna, ocasionando, em muitos casos, um espaçamento de meses entre a distribuição e a realização da audiência.

Logo, o processo poderia ficar meses parado, aguardando apenas a citação e a audiência, contrariando o princípio da celeridade.

Além disso, a prática também nos ensina que as audiências obrigatórias não demonstram eficácia, isso porque as partes, como regra geral, não apresentam uma proposta de acordo, bem como não há manifestação sobre a defesa do réu ou alegações finais, ficando o processo ao aguardo do projeto de sentença.

Assim, fazendo uma analise prática do procedimento aplicado nos Juizados, percebemos que muitos processos demoram praticamente 02 (dois) anos para haver a prolação da sentença, indo de encontro com os princípios da celeridade, economia processual e duração razoável do processo.

O Código de Processo Civil de 2015 tomou para si a adoção do procedimento comum, ou seja, um único procedimento, além dos previstos em lei especial (como a Lei nº. 9.099/95), dispondo sobre a audiência de conciliação como ato inaugural do procedimento, mas onde, teoricamente, as partes podem escolher.

Dizemos “teoricamente” porque o texto processual prevê que as partes podem optar pela realização ou não da audiência, conforme artigo 319, inciso VI, artigo 334, §5º e artigo 335, inciso II, ambos do CPC/2015. No entanto, a audiência somente deixa de ser realizada quando ambas as partes se manifestarem contrárias a audiência, conforme artigo 334, §4º, inciso I do CPC.

 

Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.

§ 4º A audiência não será realizada:

I - se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;

 

Isso porque o Código de 2015 está imbuído do espírito conciliador, conforme artigo 3º, §3º do CPC, buscando métodos de resolução de conflitos alternativos, determinando a criação de centros de solução de conflito, entre outras medidas, o que tem sido objeto de muito estudo e propagação entre os operadores do direito nos dias atuais.

No entanto, acreditamos que o inverso seria o melhor dos mundos, não só para o procedimento comum, mas como para a Lei nº 9.099/95, qual seja as partes pedirem uma audiência de conciliação.

Logo, somente teríamos audiência de conciliação ou conciliação, instrução e julgamento quando efetivamente necessário, alcançando a economia processual e celeridade.

Na prática, o procedimento do juizado poderia citar o Réu para informar se há possibilidade para acordo, requerendo a designação da audiência de conciliação, ou, no silêncio ou na impossibilidade, apresentar contestação no prazo legal, na forma do Código de Processo Civil.

Inclusive, esse é o procedimento que vem sendo adotado nos Juizados Especiais Federais, onde a audiência de conciliação somente é designada se ambas as partes querem conciliar ou quando o réu possui proposta de acordo.

Ora, analisando a origem dos Juizados Especiais de Pequenas Causas e posteriormente os Juizados Especiais Cíveis, o que se buscava era um procedimento mais célere do que apresentado pelo Código de Processo Civil de 1973.

Realmente, ao compararmos com os processos comuns, as ações que tramitam sob o rito da Lei nº. 9.099/95 são mais céleres, mas de longe ao ideal, antes a morosidade dos Tribunais.

A demora do trâmite processual no Brasil não é novidade alguma para o cidadão brasileiro, o que contribui sobremaneira para a descrença da sociedade frente à eficiência da Justiça Brasileira.

Poderíamos citar estudos do Conselho Nacional de Justiça, demonstrando a ineficácia das audiências de conciliação nos Juizados, mas o apelo no presente estudo vai além, vai na prática da advocacia.

Assim, mostra-se essencial trazer esse exercício de pensamento e questionar se a audiência de conciliação é dispensável nos Juizados Especiais.

É evidente que essa opção não implica na renúncia de uma eventual composição, até mesmo porque por mais ineficiente que se deem as tratativas de acordo entre os litigantes, o juiz sempre poderá convidar as partes para uma tentativa de mediação extrajudicial ou as partes podem requerer a designação de audiência de conciliação.

De todo modo, é imprescindível destacar que a possibilidade de tornar a audiência de conciliação facultativa, pode beneficiar todas as partes envolvidas na relação processual com a redução da estimativa de duração do processo, pois nem o autor ou mesmo o réu precisariam aguardar a disponibilidade de agenda dos tribunais para avançar para a próxima etapa processual.

E mais, há de se levar em consideração que na maioria das vezes essas audiências de conciliação não são frutíferas, sem considerar que a sua dispensa resulta em corte de gastos de locomoção incorridos pelas partes, bem como economia do tempo útil dos litigantes e dos funcionários da justiça.

Nesse sentido, a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM, também veio a reforçar esse entendimento ao aprovar seu Enunciado de nº 35 cujo conteúdo autoriza o juiz a adaptar o rito processual conforme as especificidades da demanda[1].

Face a todo o exposto, se faz necessário fazer essa reflexão, haja vista que a Lei nº. 9.099/95 completa 25 anos em setembro de 2020, sendo necessária uma revisão no texto, de forma a atender melhor os anseios da sociedade, bem como aos princípios que a norteiam.



[1] ENFAM - Enunciado 35 - Além das situações em que a flexibilização do procedimento é autorizada pelo art. 139, VI, do CPC/2015, pode o juiz, de ofício, preservada a previsibilidade do rito, adaptá-lo às especificidades da causa, observadas as garantias fundamentais do processo.


quarta-feira, 23 de setembro de 2020

OS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS E SUA BASE PRINCIPIOLÓGICA

 

Gustavo Sales

23 de setembro de 2020.


O presente artigo tem por objetivo realizar um breve levantamento teórico da Lei 9.099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, tendo como referência principiológica a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, bem como alguns aspectos procedimentais da própria Lei 9.099/95.

O procedimento dos Juizados Especiais Criminais esta esculpido no Capítulo III, da Lei 9.099/95, e possui sua origem na Constituição Federal de 1988, mais precisamente no artigo 98, inciso I, que determina que é de competência dos estados regulamentar os juizados especiais cíveis e criminais para julgar as causas menor complexidade e os crimes de menor potencial lesivo, in verbis:

 

Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:

I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;

 

Com a regulamentação dos Juizados Especiais Criminais, o legislador entendeu que os crimes de menor potencial ofensivo deveriam seguir o rito procedimental contido na Lei 9.099/95, normativo que é orientado por princípios de origem constitucional.

Ademais, essa previsão que a Constituição Federal traz no seu artigo 98, inciso I, a lei 9.099/95, também firmou no artigo 62, em especial na parte dos Juizados Especiais Criminais, que estabelece que os procedimentos irão se reger pela obediência desses princípios.

 

Art. 62.  O processo perante o Juizado Especial orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade. (Redação dada pela Lei nº 13.603, de 2018)

 

Portanto, os Juizados Especiais Criminais devem valorizar um procedimento oral, ou seja, a oralidade no oferecimento da denúncia, a defesa poderá ser oral, somente sendo escrito aquilo que é efetivamente relevante e que necessite que se reduza a termo.

 

Art. 65. [...]

§ 3º Serão objeto de registro escrito exclusivamente os atos havidos por essenciais. (grifo nosso)

 

Esses princípios constitucionais são interligados entre si, a informalidade esta vinculada com a oralidade e vice-versa. Entretanto, quando se esta diante de um rito que prestigia a informalidade é necessário um arcabouço maior de informações na produção da prova e é nesse sentido que os operadores do direito precisam ficar atentos.

O procedimento nos juizados especiais possui como finalidade a celeridade e economia. Então, há que se prezar pela informalidade, mas no sentido procedimental da prática dos atos dentro do processo, no dia a dia de atuação nos fóruns, com o objetivo de tornar a tutela jurisdicional mais efetiva, sem necessariamente, se apegar as formas dogmáticas.

Por isso, os juizados são informais e econômicos, onde não existe um processo dividido por etapas procedimentais que sejam de alto custo. Nos Juizados Especiais Criminais não se fala em perícias complexas é um procedimento barato porque lida com crimes de menor potencial ofensivo. Se o procedimento é informal, oral, econômico, por óbvio será um procedimento célere.

Em 2018, entrou em vigor a lei 13.603, que inseriu no artigo 62 da Lei 90999/95, o princípio da simplicidade como critério orientador do processo perante os Juizados Especiais Criminais. Foi a maneira que o legislador se valeu para reforçar, diante da sociedade, a necessidade desse procedimento ser simples e eficaz, produzindo uma resposta rápida para os jurisdicionados, seja o autor dos fatos ou a vítima. Neste ponto cabe a reflexão no sentido de que a simplicidade já estava inserida em todos os demais princípios, pois se o procedimento é informal, econômico, célere, nos parece que o corolário lógico é que estamos diante de um procedimento simplificado.

Passemos a analisar algumas regras específicas contidas na Lei 9.099/95. A primeira coisa é entender o que é o menor potencial ofensivo, isso porque o artigo 98, inciso I, da constituição reza que é competência dos juizados especiais criminais julgar os crimes de menor potencial ofensivo. A Lei dos Juizados Especiais adotou um critério quantitativo, ou seja, a quantidade de pena estabelecida para cada crime, para, assim, saber se ele é de menor potencial ofensivo.

 

Art. 61.  Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa.

 

A maioria da doutrina entende que a pena tem a função retributiva em que a finalidade da pena é o restabelecimento da ordem violada pelo delito, na medida em que a pena deve ser proporcional ao crime cometido e a função preventiva que tem como premissa a de que a prevenção geral é tanto mais eficiente quanto maior é a certeza da punição. Se for levada em consideração a função retributiva da pena, que é “punir”, essa “punição” tem que ser proporcional à lesão que o crime provocou, então, o poder de ofensividade daquela conduta tem que possuir uma pena compatível.

O legislador adotou a ideia de que o crime que possui pena máxima em abstrato menor ou igual a dois anos é de competência dos juizados especiais. Se analisarmos o crime de homicídio simples, artigo 121, do Código Penal, a previsão da pena é de seis a vinte anos, portanto, estamos diante de um crime que não é de competência dos Juizados Especiais Criminais. Porém, se analisarmos as penas dos crimes de calúnia, difamação, injúria, por exemplo, todos possuem pena máxima em abstrato inferior ou igual a dois anos, logo, são de competência dos Juizados Especiais Criminais.

Entretanto, existe uma exceção no artigo 94 da Lei 10.741/03, que dispõe sobre o Estatuto do Idoso, onde é possível que Juizado Especial Criminal julgue crimes com pena máxima em abstrato maior do que dois anos, vejamos:

 

Art. 94. Aos crimes previstos nesta Lei, cuja pena máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 (quatro) anos, aplica-se o procedimento previsto na Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, e, subsidiariamente, no que couber, as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal.

 

Em primeira análise pode parecer inusitado o artigo 94, que estabelece que os crimes previstos na Lei 10.741/03, cuja pena não ultrapasse quatro anos serão julgados pelo procedimento dos Juizados Especiais Criminais. Na verdade, existe um contra senso, posto que os Juizados Especiais Criminais julgam crimes de menor potencial ofensivo e quando o estatuto do idoso entrou em vigência em 2003, a ideia do legislador seria repreender com mais rigor o indivíduo que cometesse crimes contra o idoso. Mas, se a ideia era proteger uma casta vulnerável da sociedade, onde esta a lógica de submeter os crimes praticados contra idosos, cuja pena não ultrapasse quatro anos ao Juizados Especiais Criminais?

Esta discussão perdurou por algum tempo na doutrina e na jurisprudência, até que alcançou o STF, onde sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia, julgou-se a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3096), estabelecendo que quando a Lei referiu-se no artigo 94, que os crimes previstos no estatuto do idoso, cuja pena não ultrapasse quatro anos serão julgados pelos juizados especiais é apenas no que se refere ao procedimento, pois trata-se de é um procedimento mais célere.

 

Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por unanimidade, não conheceu da ação direta relativamente ao art. 39 da Lei nº 10.741/2003. Prosseguindo no julgamento, após o voto da Senhora Ministra Cármen Lúcia (Relatora), julgando parcialmente procedente a ação para dar interpretação conforme ao art. 94 da referida lei, no sentido de aplicar-se apenas o procedimento previsto na Lei nº 9.099/95 e não outros benefícios ali previstos, e após o voto do Senhor Ministro Eros Grau, julgando-a improcedente, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Carlos Britto. Ausentes, licenciados, os Senhores Ministros Joaquim Barbosa e Menezes Direito. Presidência do Senhor Ministro Gilmar Mendes. Plenário, 19.08.2009.

 

Portanto, em razão desse julgado, acabaram as intepretações e os crimes cuja pena não ultrapassa quatro anos, previstos no estatuto do idoso serão julgados pelos Juizados Especiais Criminais, mas, tão somente, no tocante ao procedimento, as medidas despenalizadoras não serão aplicadas para os crimes onde a pena seja maior que dois anos, pois passa à margem do que é previsto, inicialmente, da competência dos Juizados Especiais Criminais.

Da mesma forma, existe a não extensão da Lei Juizados Especiais Criminais para alcançar crimes que, inicialmente, estavam previstos em sua competência para julgamento.

Há, ainda, uma afastabilidade, ou seja, o procedimento dos Juizados Especiais Criminais não sendo aplicado para crimes cuja pena seja menor que dois anos, por exemplo, não serão julgados pelos Juizados Especiais Criminais os crimes previstos na Lei 11.340/06, Lei Maria da Penha, por previsão expressa em seu artigo 41.

 

Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.

 

Então, na medida em que existe uma extensão no Estatuto do Idoso, na Lei Maria da Penha há uma afastabilidade desse instituto dos Juizados Especiais Criminais, pois não irão julgar crimes cometidos contra a mulher no ambiente doméstico e familiar.

Outro detalhe interessante é que quando se observa a extensão e afastabilidade é possível perceber que, além da Lei Maria da Penha, existe uma outra situação que afasta a competência dos Juizados Especiais Criminais, que são os casos de conexão prevista no artigo 76 do Código de Processo Penal, que estabelece que quando os crimes são cometidos nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e modo de execução, a prova de um depende da prova do outro. Então, quando falamos de conexão é possível que a competência dos Juizados Especiais Criminais seja afastada. Mas cumpre ressaltar que não se afasta a incidência das medidas despenalizadoras, o que significa dizer que o réu manterá o seu direito de transação penal, composição civil dos danos e da suspensão condicional do processo, sendo aplicável ao caso.

Diante do que foi exposto, conclui-se que os Juizados Especiais Criminais é um organismo onde se busca distribuição da justiça de maneira ágil, simplificada e desburocratizada, ao contrário do que se encontra no procedimento criminal tradicional.


terça-feira, 22 de setembro de 2020

JUIZADO ESPECIAL FEDERAL A PERSONIFICAÇÃO DA LEI Nº. 9.099/95

 


Wellington da Silva de Paula

21 de setembro 2020.


A Lei nº. 9.099 de 26 de setembro de 1995 criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, com o intuito de solucionar os conflitos de menor complexidade de maneira mais célere e simples, com a intenção de possibilitar ao cidadão o acesso ao Poder Judiciário.

O novo procedimento foi idealizado como uma forma de facilitação de acesso à justiça, inclusive prevendo a possibilidade de ingresso sem advogado.

Ao longo dos anos, percebemos altos e baixos nos julgamentos dos processos em tramite pelo procedimento da Lei 9.099/95.

O Juizados Especial Cível tornou-se a casa do consumidor, visto que o Código de Defesa do Consumidor havia sido promulgado em 11 de setembro de 1990, entrando em vigor em março do ano seguinte, encontrando nos Juizados o acesso ao Poder Judiciário de uma forma mais célere e sem custos.

Desse modo, a soma do Código de Defesa do Consumidor e os Juizados Especiais o cidadão foi estimulado a exercer a cidadania, buscando a Justiça para resolver os seus conflitos.

No ano de 2015 o Conselho Nacional de Justiça publicou uma matéria[1] informando que existiam no Brasil 1.534 Juizados Especiais na Justiça Estadual e 213 na Justiça Federal, apontando que cerca de 7,2 milhões de processos tramitavam nos Juizados.

Todavia, apesar do intuito da Lei 9.099, de trazer um procedimento mais simples e ágil, a taxa de congestionamento dos juizados chegou a 52% em 2014, de acordo com a informação do CNJ, supramencionada.

O CNJ pode até precisar contratar empresas para realizar estudos, mas os advogados não. Todos sabem como é moroso o Poder Judiciário, principalmente os Juizados Especiais Cíveis.

Além disso, as sentenças não refletem a realidade fática, muito menos primam pelo cumprimento dos institutos, seja instituído pelo Código de Defesa do Consumidor ou mesmo pelo ideal da compensação por danos morais.

Por outro lado, é inegável que o aumento do número de ações distribuídas também contribui para a morosidade, mas é claro que as sentenças injustas também têm uma farpela nesses números, isso porque a impunidade gera a continuidade de maus serviços, que leva a novas ações.

A prática junto a Justiça Federal nos leva a entender que os Juizados Especiais Federais vêm aplicando o espírito da Lei nº. 9.099/95.

Se faz necessário frisar que o Juizado Especial Federal não foi criado pela Lei nº. 9.099/95, mas pela Lei nº. 10.291 de 12 de julho de 2001, contudo, os Juizados Federais buscam inspiração direta, subsidiariamente, e indireta daquela lei.

 

1. OS PRINCÍPIOS QUE REGEM O SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS

 

Para entender bem o espírito da Lei nº. 9.099/95, é preciso identificar os princípios que regem a legislação.

O artigo 2º da Lei nº. 9.099/95 prevê:

 

Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.

 

Então, os princípios que regem os Juizados são: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade.

 

1.1. Princípio da Oralidade

 

O princípio da oralidade está baseado na utilização da via oral e direta, sem necessidade de atender demasiadas formalidades.

Na leitura da lei é possível verificar que a própria contestação pode ser feita de forma oral, durante a audiência de conciliação, instrução e julgamento, artigo 30, vejamos:

 

Art. 30. A contestação, que será oral ou escrita, conterá toda matéria de defesa, exceto argüição de suspeição ou impedimento do Juiz, que se processará na forma da legislação em vigor.

 

Frisa-se que o ato pode ser praticado de forma oral, mas por uma questão de organização processual, a manifestação é levada a termo, ou seja, qual falamos da contestação oral, o magistrado ou o secretário deve registrar a manifestação na ata da audiência.

No tocante as demais manifestações, inclusive a petição inicial, os Tribunais disponibilizam Núcleos de Primeiro Atendimento, para o ingresso da ação, e formulários nas secretarias dos Juizados, para as demais manifestações.

 

1.2. Princípio da Simplicidade

 

O princípio da simplicidade está relacionado com a desnecessidade de formalismo, bem como do procedimento mais simples, o que afasta a produção de provas complexas, como prova pericial, que demandaria a analise de um laudo técnico, além da elaboração de quesitos.

Portanto, o princípio da simplicidade visa um processo simples, sem complexidade.

 

1.3. Princípio da informalidade

 

O princípio da informalidade está diretamente ligado ao princípio da simplicidade, pois ambos buscam desenvolver um processo mais simples, sem exageradas formalidade, para que o processo não se torne complexo como é no procedimento comum, pois, esse procedimento visa facilitar o acesso a sociedade.

Obviamente, todo procedimento possui uma formalidade, mas o que a Lei nº. 9.099/95 buscou era simplificar os procedimentos já estabelecidos no Código de Processo Civil.

Vale frisar que na época da promulgação da Lei dos Juizados, vigorava o Código de Processo Civil de 1973, antes das principais reformas no processo de execução. Logo, o processo comum apresentava um procedimento muito mais complexo, então o Juizado visou simplificar, afastando diversos formalismos do processo comum.

Por exemplo, desde sempre, o procedimento do Juizado é uno, dividido em fases: conhecimento, recursal e execução. Não havia a necessidade de novos autos para inicial a execução.

 

1.4. Princípio da economia processual

 

O Juizado Especial Cível é uma concretização do acesso à justiça a todos, no qual, proporciona condições para que os cidadãos possam rever seus direitos violados ou ameaçados, sem pagar custas processuais, salvo na fase recursal, quando vê a necessidade de requerer o benefício da justiça gratuita, artigo 54 e Parágrafo Único da Lei nº. 9.099/95, vejamos:

 

Art. 54. O acesso ao Juizado Especial independerá, em primeiro grau de jurisdição, do pagamento de custas, taxas ou despesas.

Parágrafo único. O preparo do recurso, na forma do § 1º do art. 42 desta Lei, compreenderá todas as despesas processuais, inclusive aquelas dispensadas em primeiro grau de jurisdição, ressalvada a hipótese de assistência judiciária gratuita.

 

Além do preparo recursal, o autor da ação também pode ser condenado as custas se faltar a qualquer audiência, conforme artigo 51, inciso I e §2º da Lei dos Juizados, ei-lo:

 

Art. 51. Extingue-se o processo, além dos casos previstos em lei:

I - quando o autor deixar de comparecer a qualquer das audiências do processo;

§ 2º No caso do inciso I deste artigo, quando comprovar que a ausência decorre de força maior, a parte poderá ser isentada, pelo Juiz, do pagamento das custas.

Assim, diferente do processo comum, no Juizado o autor e o Réu tem acesso à justiça sem custas.

 

1.5. Princípio da Celeridade

 

O princípio da celeridade está ligado a um processo mais rápido, mas respeitando o princípio do devido processo legal. Logo, o procedimento do Juizado deve ser rápido, terminando o mais rápido possível, sem prejudicar a segurança dos atos processuais.

Portanto, devido aos princípios que regem o Juizado Especial, verifica-se que a tendência e que o processo seja célere, não possui muito formalismo, busca a simplicidade, informalidade, a conciliação e a transação, resultando um procedimento mais rápido do que o procedimento comum.

 

2. ATUAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS

 

Ao lermos um artigo, normalmente o autor se volta muito mais sobre teses e teorias, deixando de lado a aplicação do direito no contencioso.

O sistema processual brasileiro é voltado para o contencioso, apesar dos movimentos para a ampliação da conciliação e mediação prévia, que fundamenta, também, o Código de Processo Civil de 2015, o Brasil continua adotando a solução litigiosa dos conflitos.

Desta forma, se faz necessária uma pitada da visão prática do direito, principalmente pela visão do advogado.

Atuando junto a Justiça Federal, podemos perceber que a busca por atender os princípios estabelecidos aos Juizados é muito latente. Raros são os processos com mais de 02 (dois) anos, isso contando com recurso e cumprimento de sentença.

A vida útil do processo junto aos Juizados Federais é muito pequena em comparação com os Juizados Estaduais.

O Poder Judiciário Federal se mostra mais atuante e acessível, buscando, também, soluções pacíficas de conflitos, com seus centros de conciliação.

Podemos ver processos sendo encerrados com menos de 06 (seis) meses de tramite.

É evidente que a Justiça Federal terá menos processos sendo distribuídos do que a Justiça Estadual, ante a sua competência, no entanto, a busca por um procedimento mais célere é o destaque para a atuação da Federal.

Vale frisar que a Lei do Juizado Federal prevê prazos diferentes para contestação e cumprimento de sentença, artigos 9º e 17 da Lei nº. 10.259/01, vejamos:

 

Art. 9º Não haverá prazo diferenciado para a prática de qualquer ato processual pelas pessoas jurídicas de direito público, inclusive a interposição de recursos, devendo a citação para audiência de conciliação ser efetuada com antecedência mínima de trinta dias.

 

Art. 17. Tratando-se de obrigação de pagar quantia certa, após o trânsito em julgado da decisão, o pagamento será efetuado no prazo de sessenta dias, contados da entrega da requisição, por ordem do Juiz, à autoridade citada para a causa, na agência mais próxima da Caixa Econômica Federal ou do Banco do Brasil, independentemente de precatório.

 

Inobstante, na prática, o procedimento do Juizado Especial Federal leva a risca todos os princípios dos Juizados, principalmente celeridade, economia processual, simplicidade e informalidade.

Primeiro, as secretarias dos Juizados Federais somente designam audiência de conciliação quando há a possibilidade real de acordo, dando maior agilidade ao procedimento.

Segundo, o incentivo a conciliação, inclusive com a criação do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania, designando constantemente mutirões de conciliação, chegando a realizar mais de 98% (noventa e oito por cento) de acordos[2].

Terceiro, os processos tramitam de forma mais célere do que na Justiça Estadual, mesmo com a possibilidade de prova pericial.

Por último, as sentenças, em sua maioria, são mais completas, analisando ponto a ponto, demonstrando a fundamentação do magistrado para o julgamento da causa.

Assim, para quem atua diariamente com contencioso, os Juizados Especiais Federais representam o verdadeiro espírito previsto pela Lei nº. 9.099/95.

 



[1] https://www.cnj.jus.br/juizados-especiais-completam-20-anos-com-7-milhoes-de-acoes-em-tramitacao/

[2] https://www.jfrj.jus.br/noticia/1o-mutirao-de-conciliacao-virtual-da-justica-federal-da-2a-regiao-atinge-9813-de-acordos


segunda-feira, 21 de setembro de 2020

JUIZADOS ESPECIAIS – O MICRO QUE SE TORNOU MACRO

 


Bruno Duque

21 de setembro 2020.

1 - JUIZADOS ESPECIAIS – SUA ORIGEM ESQUECIDA

 

A Lei nº. 9099/95 instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais nas esferas estaduais, servindo como grande marco de democratização do acesso ao judiciário por aqueles que não tinham condição de fazê-lo antes, mas o embrião desta lei foi outra lei que já trazia os contornos daquilo que existe hoje.

 

1.1  – A Lei dos Juizados de Pequenas Causas

 

No ano de 1984 a Lei nº. 7.244 instituiu a possibilidade de criação dos chamados Juizados Especiais de Pequenas Causas, no âmbito dos estados e distrito federal para julgamento de causas de valor econômico reduzido.

A semelhança entre a lei dos Juizados de Pequenas Causas e a Lei nº 9099/95 é tamanha que a lei nova perfaz fiel transcrição da antiga em muitos institutos, mas é facilmente constatável que os Juizados Especiais de Pequenas Causas eram possíveis apenas na Seara Cível, sendo o atual juizado Especial Cível (JEC) o sucessor direto do antigo sistema, valendo citar os trechos onde isso fica cristalino:

 

Lei nº 7.244/84 de 7 de novembro de 1984

[...]

Art. 1º Os Juizados Especiais de Pequenas Causas, órgãos da justiça ordinária, poderão ser criados nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios, para processo e julgamento, por ação do autor, das causas de reduzido valor econômico.

[...]

Art. 3º Consideram-se causas de reduzido valor econômico as que versem sobre direitos patrimoniais e decorram de pedido que, à data do ajuizamento, não exceda a 20 (vinte) vezes o salário mínimo vigente no País  e tenha por objeto:

I – A condenação em dinheiro;

II – A condenação a entrega de coisa certa móvel ou ao cumprimento de obrigação de fazer, a cargo de fabricante ou fornecedor de bens e serviços para consumo;

III – A desconstituição e a declaração de nulidade de contrato relativo a coisas moveis e semoventes.

§1º Esta lei não se aplica às causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, nem às relativas a acidentes do trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.

 

O extrato supra permite a conclusão trazida mais acima, ficando claro que o embrião do sistema atual pensava apenas na vertente Civil, não imaginando similar em Seara Penal, como veio com a legislação de 1995.

 

2 – LEI nº. 9.099/95 E SUA INOVAÇÃO

 

Com o advento da Lei nº. 9.099/95 veio a consolidação do instituto Civil das Pequenas Causas, agora tratadas como causas de menor complexidade, mas a grande inovação foi a criação desse tipo de juizado na esfera criminal, mostrando uma mudança de pensamento no mundo jurídico.

Causas que passaram a ser chamadas de “Infrações Penais de Menor Potencial Ofensivo” (art. 60 Lei nº. 9.099/95) passaram a figurar como de competência dos Juizados Especiais Criminais (JECRIM), sendo assim definidas as contravenções penais e crimes onde a pena máxima em abstrato não seja superior a 02 (dois) anos, cumulada ou não com multa (art. 61 Lei nº. 9.099/95).

A alteração da competência de tais infrações não se deu apenas para desafogar o juízo comum, mas trouxe uma consciência desencarceradora com os institutos despenalizadores que fazem parte da processualística do JECRIM (art. 62 Lei nº. 9.099/95): 1 - Composição Civil (art. 74 e 75 Lei nº. 9.099/95); 2 – “Transação Penal” (art. 76 Lei nº. 9.099/95); 3 – Sursis Processual (art. 89 Lei nº 9.099/95).

 

3 – JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS

 

O sucesso do microssistema dos Juizados (na época JEC e JECRIM), que foram criados para instalação nos Judiciários em âmbito estadual fez com que, no ano de 2001, fosse criada a Lei nº 10.259 e assim fossem criados Juizados Especiais na esfera do Judiciário Federal, seguindo o exemplo da Lei nº. 9.099/95, que subsidia a própria lei dos Juizados Especiais Federais, ali também foram abarcadas a esfera Cível e Criminal.

Importante destacar que a Lei nº. 10.259/01 teve papel importante na definição das infrações de menor potencial ofensivo subindo a pena máxima em abstrato para delimitação dessa menor potencialidade de 1(um) ano (art. 61 Lei nº 9.099/95 – com redação posteriormente alterada) para 02 (dois) anos (art. 2º Parágrafo Único da Lei nº. 10.259/91 – com redação posteriormente alterada).

 

4 – OS JUIZADOS FAZENDÁRIOS

 

Prosseguindo a escalada de sucesso que o sistema de Juizados Especiais encontrou, no ano de 2009 um “novo membro se juntou a família”, a Lei nº 12.153 instituiu, no âmbito dos estados e distrito federal os Juizados Especiais da Fazenda Pública, com competência absoluta para os casos a eles atribuídos (art. 2º Lei nº. 12.153/09).

 

5 – CONCLUSÃO

 

A maximização do microssistema inicial dos Juizados Especiais demonstra sucesso na construção legal, mas alguns problemas precisam ser resolvidos para aperfeiçoamento jurídico e melhor aplicação da justiça, sendo exemplos de tais problemas, a desnecessidade de capacidade postulatória para causas limitadas a 20 (vinte) salários mínimos na esfera cível (de ordem legal), ou a melhoria das estruturas cartorárias para maior celeridade e desburocratização (de ordem prática), tudo para que a democratização do acesso ao Judiciário seja confirmada e consolidada.