Marcio
Henrique Ribeiro
25
de setembro de 2020.
O
artigo 16 da Lei nº. 9.099/95 prevê que: “Registrado o pedido,
independentemente de distribuição e autuação, a Secretaria do Juizado designará
a sessão de conciliação, a realizar-se no prazo de quinze dias”.
Logo,
o legislador previa que antes mesmo da distribuição do processo, a secretaria
do juizado designaria uma audiência de conciliação para 15 dias.
Tal
previsão seguia os princípios instituídos no artigo 2º da Lei dos Juizados: “O
processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade,
informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível,
a conciliação ou a transação”.
Nota-se
que o mesmo artigo já previa que o Juizado Especial Cível deveria priorizar
pela conciliação ou a transação, novamente no intuito de trazer um procedimento
mais célere, informal e econômico.
Contudo,
a prática nos ensina que o ideal do legislador dificilmente é alcançada,
começando com a designação da audiência antes da distribuição da demanda, sendo
realizada 15 (quinze) dias após a reclamação do autor.
Na
verdade, o procedimento dos Juizados segue um ritmo diferente da legislação,
variando, também, de estado para estado.
Tomando
por base do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, os processos são
distribuídos e autuados automaticamente, com, inclusive, a designação de uma
audiência de conciliação.
No
entanto, diferente do previsto na Lei nº. 9.099/95, a audiência não é designada
para daqui a 15 dias, fato impossível para o número de distribuições diárias de
novos processos.
Além
disso, sendo marcada uma audiência tão próxima, a citação poderia ocorrer
também muito próxima, contrariando os ditames da lei processual, isso porque, o
Código de Processo Civil/1973 (em vigor na época da criação da Lei nº. 9.099/95)
instituía que o prazo mínimo que deveria entremear a citação e a audiência era
de 10 (dez) dias, conforme artigo 277, vejamos:
Art. 277.
O juiz designará a audiência de conciliação a ser realizada no prazo de trinta
dias, citando-se o réu com a antecedência mínima de dez dias e sob advertência
prevista no § 2º deste artigo, determinando o comparecimento das partes. Sendo
ré a Fazenda Pública, os prazos contar-se-ão em dobro. (Redação dada pela Lei
nº 9.245, de 26.12.1995)
Lembrando
que o Código de Processo Civil é aplicado subsidiariamente, conforme artigo 92
da Lei nº. 9.099/95.
Assim,
as secretarias dos Juizados passaram a designar as audiências de conciliação de
acordo com a agenda interna, ocasionando, em muitos casos, um espaçamento de
meses entre a distribuição e a realização da audiência.
Logo,
o processo poderia ficar meses parado, aguardando apenas a citação e a
audiência, contrariando o princípio da celeridade.
Além
disso, a prática também nos ensina que as audiências obrigatórias não
demonstram eficácia, isso porque as partes, como regra geral, não apresentam
uma proposta de acordo, bem como não há manifestação sobre a defesa do réu ou
alegações finais, ficando o processo ao aguardo do projeto de sentença.
Assim,
fazendo uma analise prática do procedimento aplicado nos Juizados, percebemos
que muitos processos demoram praticamente 02 (dois) anos para haver a prolação
da sentença, indo de encontro com os princípios da celeridade, economia
processual e duração razoável do processo.
O
Código de Processo Civil de 2015 tomou para si a adoção do procedimento comum,
ou seja, um único procedimento, além dos previstos em lei especial (como a Lei
nº. 9.099/95), dispondo sobre a audiência de conciliação como ato inaugural do
procedimento, mas onde, teoricamente, as partes podem escolher.
Dizemos
“teoricamente” porque o texto processual prevê que as partes podem optar pela
realização ou não da audiência, conforme artigo 319, inciso VI, artigo 334, §5º
e artigo 335, inciso II, ambos do CPC/2015. No entanto, a audiência somente
deixa de ser realizada quando ambas as partes se manifestarem contrárias a
audiência, conforme artigo 334, §4º, inciso I do CPC.
Art.
334. Se a petição inicial preencher os
requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o
juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima
de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de
antecedência.
§
4º A audiência não será realizada:
I
- se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição
consensual;
Isso
porque o Código de 2015 está imbuído do espírito conciliador, conforme artigo
3º, §3º do CPC, buscando métodos de resolução de conflitos alternativos,
determinando a criação de centros de solução de conflito, entre outras medidas,
o que tem sido objeto de muito estudo e propagação entre os operadores do
direito nos dias atuais.
No
entanto, acreditamos que o inverso seria o melhor dos mundos, não só para o
procedimento comum, mas como para a Lei nº 9.099/95, qual seja as partes
pedirem uma audiência de conciliação.
Logo,
somente teríamos audiência de conciliação ou conciliação, instrução e
julgamento quando efetivamente necessário, alcançando a economia processual e
celeridade.
Na
prática, o procedimento do juizado poderia citar o Réu para informar se há
possibilidade para acordo, requerendo a designação da audiência de conciliação,
ou, no silêncio ou na impossibilidade, apresentar contestação no prazo legal,
na forma do Código de Processo Civil.
Inclusive,
esse é o procedimento que vem sendo adotado nos Juizados Especiais Federais,
onde a audiência de conciliação somente é designada se ambas as partes querem
conciliar ou quando o réu possui proposta de acordo.
Ora,
analisando a origem dos Juizados Especiais de Pequenas Causas e posteriormente
os Juizados Especiais Cíveis, o que se buscava era um procedimento mais célere
do que apresentado pelo Código de Processo Civil de 1973.
Realmente,
ao compararmos com os processos comuns, as ações que tramitam sob o rito da Lei
nº. 9.099/95 são mais céleres, mas de longe ao ideal, antes a morosidade dos
Tribunais.
A
demora do trâmite processual no Brasil não é novidade alguma para o cidadão
brasileiro, o que contribui sobremaneira para a descrença da sociedade frente à
eficiência da Justiça Brasileira.
Poderíamos
citar estudos do Conselho Nacional de Justiça, demonstrando a ineficácia das
audiências de conciliação nos Juizados, mas o apelo no presente estudo vai
além, vai na prática da advocacia.
Assim,
mostra-se essencial trazer esse exercício de pensamento e questionar se a
audiência de conciliação é dispensável nos Juizados Especiais.
É
evidente que essa opção não implica na renúncia de uma eventual composição, até
mesmo porque por mais ineficiente que se deem as tratativas de acordo entre os
litigantes, o juiz sempre poderá convidar as partes para uma tentativa de
mediação extrajudicial ou as partes podem requerer a designação de audiência de
conciliação.
De
todo modo, é imprescindível destacar que a possibilidade de tornar a audiência
de conciliação facultativa, pode beneficiar todas as partes envolvidas na
relação processual com a redução da estimativa de duração do processo, pois nem
o autor ou mesmo o réu precisariam aguardar a disponibilidade de agenda dos
tribunais para avançar para a próxima etapa processual.
E
mais, há de se levar em consideração que na maioria das vezes essas audiências
de conciliação não são frutíferas, sem considerar que a sua dispensa resulta em
corte de gastos de locomoção incorridos pelas partes, bem como economia do
tempo útil dos litigantes e dos funcionários da justiça.
Nesse
sentido, a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados -
ENFAM, também veio a reforçar esse entendimento ao aprovar seu Enunciado de nº
35 cujo conteúdo autoriza o juiz a adaptar o rito processual conforme as
especificidades da demanda[1].
Face
a todo o exposto, se faz necessário fazer essa reflexão, haja vista que a Lei
nº. 9.099/95 completa 25 anos em setembro de 2020, sendo necessária uma revisão
no texto, de forma a atender melhor os anseios da sociedade, bem como aos
princípios que a norteiam.
[1]
ENFAM - Enunciado 35 - Além das situações em que a flexibilização do
procedimento é autorizada pelo art. 139, VI, do CPC/2015, pode o juiz, de
ofício, preservada a previsibilidade do rito, adaptá-lo às especificidades da
causa, observadas as garantias fundamentais do processo.